Central Nuclear de Ferrel – Wikipédia, a enciclopédia livre
Central Nuclear de Ferrel | |
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Informações gerais | |
Tipo | central nuclear, projeto abandonado |
Geografia | |
País | Portugal |
Localização | Ferrel, Peniche |
A Central Nuclear de Ferrel foi uma central eléctrica planeada mas nunca construída, que se iria localizar nas imediações da povoação de Ferrel, no concelho de Peniche, em Portugal.
Descrição e história
[editar | editar código-fonte]Planeamento
[editar | editar código-fonte]Caso tivesse sido construída, a central nuclear estaria situada na zona do Moinho Velho, a cerca de quatro quilómetros da localidade do Ferrel.[1]
Na década de 1960, ainda durante o período da ditadura, foram lançados os primeiros planos para a instalação de um conjunto de centrais nucleares em território nacional, que contaram com a forte presença da Companhia Portuguesa de Electricidade.[2] Este programa continuou logo após a Revolução de 25 de Abril de 1974, tendo sido planeada a instalação do primeiro grupo nuclear no Ferrel,[2] por parte da Companhia Portuguesa de Electricidade,[3] que então já se encontrava numa fase de transição para a empresa EDP - Electricidade de Portugal.[2] Este empreendimento foi duramente criticado pelas populações, que receavam que a central nuclear tivesse efeitos negativos sobre a pesca, que então era uma das principais funções económicas da região,[4] através da canalização da água de arrefecimento para o oceano.[3] Com efeito, segundo especialistas em energia nuclear, previa-se que a operação de uma central eléctrica deste tipo, com a potência de mil megawatts, iria utilizar uma quantidade de água cerca de dez vezes superior ao consumo registado em Lisboa, e que iria aumentar a temperatura das águas em cerca de dez a quinze graus, atingindo a fauna marítima, principalmente os mariscos.[4] Além disso, durante o seu funcionamento a energia não aproveitada sob a forma eléctrica iria provocar um grande aumento de temperatura na zona em redor, que também iria trazer problemas à fauna e flora locais.[3] Durante estes movimentos populares, foram destruídos os instrumentos colocados pela empresa Electricidade de Portugal, que tinham como finalidade estudar as condições ambientais do local, incluindo os níveis naturais de radioactividade.[2] Além das populações, a instalação da central no Ferrel também foi criticada por especialistas em energia nuclear e por técnicos da própria empresa operadora da central, que formaram um conjunto chamado de Grupo dos Preocupados.[2]
Os defensores da opção nuclear argumentaram que a geração de energia por centrais deste tipo seria menos dispendiosa, e que as alternativas eram menos eficientes, tanto do ponto de vista económico como da produção, ainda mais porque se previa que o consumo nacional iria duplicar nos sete anos seguintes.[3] Seria necessário construir um grande número de barragens hidroeléctricas para acompanhar a evolução do consumo, enquanto que no caso das centrais a carvão e petróleo teria de se importar uma quantidade maior de combustível, a preços elevados.[3] Por seu turno, também a operação de centrais nucleares iria gerar dependência tecnológica em relação ao estrangeiro, sendo esta indústria então dominada pela União Soviética e pelos Estados Unidos da América, potências ideologicamente distintas, pelo que a opção por uma ou outra iria ter graves consequências a nível diplomático e de soberania nacional.[3] Uma preocupação semelhante foi expressa num artigo publicado na revista Poder Popular de 23 de Março de 1976, que também chamou a atenção para os riscos de segurança das próprias centrais nucleares, receios que tinham sido recentemente reacendidos por um incêndio na unidade americana de Brown's Ferry (en).[5]
Contestação popular e fim do projecto
[editar | editar código-fonte]As populações de Ferrel fizeram vários protestos junto das autoridades, sempre sem sucesso,[4] até à grande manifestação de 15 de Março de 1976.[6] Neste dia, os habitantes dirigiram-se ao local onde estavam a ser feitas as prospecções geológicas, sismológicas e eólicas, tendo convencido os trabalhadores a abandonar as operações.[4]
Este movimento inseriu-se num quadro de protesto contra a energia nuclear, durante o qual várias organizações, como o Movimento Ecológico, tinham chamado a atenção para os problemas ambientais causados por este tipo de centrais eléctricas.[4] Em Junho de 1977 foi publicado um manifesto contra a política energética nacional, e a construção de centrais nucleares, tendo a questão sido debatida por mais de cem cientistas e técnicos desta área.[7] Em Janeiro de 1978 foi organizado o festival Pela vida contra o nuclear no Ferrel e nas Caldas da Rainha, que contou com a participação de grandes nomes da música nacional, como Zeca Afonso, Vitorino, Pedro Barroso, Fausto e Sérgio Godinho.[7] O plano para a construção da central nuclear foi definitivamente abandonado em 1982.[7]
Ver também
[editar | editar código-fonte]Referências
- ↑ Agência Lusa (19 de Março de 2006). «População de Ferrel revive primeiro protesto antinuclear 30 anos depois». Público. Consultado em 30 de Maio de 2023
- ↑ a b c d e REDOL, António Mota (23 de Maio de 2023). «Uma história da energia nuclear em Portugal por um seu interveniente». O Mirante. Consultado em 1 de Junho de 2023
- ↑ a b c d e f J. M. (29 de Maio de 1976). «Maquinações políticas por detrás da central» (PDF). Vida Mundial (1889). Lisboa: Sociedade Nacional de Tipografia. p. 16-20. Consultado em 30 de Maio de 2023 – via Hemeroteca Municipal de Lisboa
- ↑ a b c d e «Ferrel recusa central nuclear». Diário de Lisboa. Ano 55 (19003). Lisboa: Renascença Gráfica. 16 de Março de 1976. p. 6. Consultado em 30 de Maio de 2023 – via Casa Comum / Fundação Mário Soares
- ↑ «A ameaça nuclear» (PDF). Ano I (34). Lisboa: Movimento de Esquerda Socialista. 23 de Março de 1976. p. 11. Consultado em 1 de Junho de 2023 – via Hemeroteca Municipal de Lisboa
- ↑ «Central Nuclear - Manifestação da População de Ferrel fez 35 anos». Câmara Municipal de Peniche. 15 de Março de 2011. Consultado em 30 de Maio de 2023
- ↑ a b c «Resenha Histórica». Junta de Freguesia de Ferrel. Consultado em 30 de Maio de 2023