Livro de Judite – Wikipédia, a enciclopédia livre

Cristofano Allori, Judith with the Head of Holofernes (1613)

Judite é um dos livros deuterocanônicos do Antigo Testamento da Bíblia Católica.[1][2] Considerado um livro apócrifo na visão protestante, possui 16 capítulos. Vem depois do livro de Tobias e antes do livro de Ester.

A Edição Pastoral da Bíblia sustenta que trata-se de uma história fictícia composta para encorajar o povo a resistir e lutar, escrita provavelmente em meados do século II a.C., durante a resistência dos Macabeus ou logo após. O livro apresenta a situação difícil do povo, oprimido por uma grande potência. Por trás de Nabucodonosor II e seu império, podemos entrever a figura de qualquer dominador com seu sistema de opressão.[3]

De acordo com a Jewish Encyclopedia, o autor do livro demonstra farto conhecimento da geografia mundial e das escrituras, no entanto ele comete o erro crasso de iniciar a história dizendo que ela se passa no décimo-segundo ano de Nabucodonosor, rei dos assírios em Nínive, e em uma época depois do retorno dos judeus do exílio; isto seria uma forma de dizer ao leitor que o livro é ficção, e não história.[4]

Por outro lado, a Tradução Ecumênica da Bíblia sustenta que o livro teria sido escrito no final do século II AC, ou mais tarde, e que se baseia em fatos reais que teriam ocorrido durante a dominação persa, trata-se de um Midrash, no qual um núcleo que pode ser real é tratado com muita liberdade, amplificado por novos episódios fictícios, fecundado por alusões a textos bíblicos. Sendo que no caso do Livro de Judite cogita-se que o autor teria se inspirado: na astúcia de Tamar (Gn 38), no assassinato de Eglon por Ehud (Jz 3:12-30), e de Siserá por Iael (Jz 4-Jz 5), no combate entre David e Golias (I Sm 17), na intervenção de Abigail junto a David https://web.archive.org/web/20091211203832/http://www.paulus.com.br/BP/_P7P.HTM I Sm 25), entre outros.[5]

De acordo com James Ussher, os eventos descritos no livro ocorreram nos anos 657 a.C. e 656 a.C.[6] Ussher interpreta Nabucodonosor, citado neste livro, como um nome genérico usado para os reis da Babilônia, e identifica o rei da Assíria e da Babilônia como sendo Saosduchinus, que governou a Assíria e a Babilônia por vinte anos, a partir de 668 a.C.[7]

Numerosas citações atestam que havia um uso difundido do Livro de Judite entre os primeiros cristãos, que foi incluído em uma lista de livros canônicos que é atribuída ao Papa Inocêncio I e data de 405. O Novo Testamento não cita o Livro de Judite, mas há semelhanças de pensamento que indicam que o livro era conhecido pela primeira geração de cristãos, tais como: Jt 1,11 e Lc 20, 11; Jt 8,6, Lc 2,37 e I Tm 5,5; Jt 8,14 e I Cor 2,11; Jt 8,25 e Tg 1,2; Jt 13,18 e Lc 1,42; Jt 13,19 e Mt 26,13.[8]

O livro relata a história de uma piedosa viúva que sai da cidade cercada, dirige-se ao acampamento do exército inimigo e com sua beleza envolve o comandante Holofernes, que se embriaga durante um banquete e tem sua cabeça cortada pela heroína desta história.[9]

Os três primeiros capítulos (Jt 1-Jt 3 descrevem os mecanismos de dominação das grandes potências: aparato militar, demonstração de força, intimidação, e também mostram como os pequenos países, intimidados, se submetem a tais pressões. A prepotência se torna verdadeiro ídolo, que exige adoração.[3]

Nos quatro capítulos seguintes (Jt 4 - Jt 7), é apresentado um país pequeno, que, apesar de dominado, se prepara para reagir, através de uma fé prática, e por outro lado, descreve a irritação do opressor, que não admite insubmissão e despreza o Deus libertador presente na história. O oprimido se vê tentado a fazer as pazes e a se conformar com a escravidão.[3]

Nos capítulos 8 e 9, a figura de Judite sugere dois símbolos que se complementam: a mulher corajosa que sai em defesa de seu povo oprimido e o próprio povo que renova sua força e fé, liderado por gente que enfrenta a covardia das autoridades e sai à luta.[3]

Nos capítulos 10 a 13, a beleza e artimanhas de Judite simbolizam a fé, que não dispensa os meios políticos na luta para eliminar os mecanismos centrais de repressão (cabeça de Holofernes). Diante de uma primeira vitória, os outros (Aquior) se unem porque começam a ter fé no Deus que liberta. Por fim, a vitória comemorada reacende o ideal de liberdade e o prazer de louvar o Deus verdadeiro, que vence os ídolos opressores.[3]

Diante da opressão, surge a questão de como proceder, havendo as alternativas de refugiar-se na fé, esperando que Deus resolva a situação, ou entrar no jogo da história, combatendo os poderosos com as mesmas armas. Disso, cabe refletir até que ponto Deus está presente na passividade ou na atividade histórica do seu povo.[3]

Nesse contexto, o Livro de Judite indica que a fé autêntica é aquela que encarna a fidelidade a Deus e ao seu projeto dentro da situação histórica concreta em que o povo está vivendo. Deus estará sempre aliado com aqueles que lutam para conquistar a liberdade e a vida, procurando destruir toda e qualquer forma de escravidão e morte. Tal luta, porém, não deve realizar-se de forma temerária. É preciso agir com discernimento, para realizar ação verdadeiramente eficaz, coerente com a fé que leva para a vida.[3]

Referências

  1. Echegary, J. González et ali (2000). A Bíblia e seu contexto. 2 2 ed. São Paulo: Edições Ave Maria. 1133 páginas. ISBN 9788527603478 
  2. Pearlman, Myer (2006). Através da Bíblia. Livro por Livro 23 ed. São Paulo: Editora Vida. 439 páginas. ISBN 9788573671346 
  3. a b c d e f g Judite Arquivado em 18 de janeiro de 2013, no Wayback Machine. Edição Pastoral da Bíblia, acessado em 29 de julho de 2010
  4. Jewish Encyclopedia, Boof of Judith [em linha
  5. Tradução Ecumênica da Bíblia Ed. Loyola, São Paulo, 1994, pp 1.559-1.560
  6. James Ussher, The Annals of the World 657 BC [em linha]
  7. James Ussher, The Annals of the World 668 BC
  8. Tradução Ecumênica da Bíblia, cit., p 1.561
  9. Tradução Ecumênica da Bíblia, cit., 1994, p 1.559

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