Poesia Lírica de Fernando Pessoa – Wikipédia, a enciclopédia livre
Fernando Pessoa (Lisboa, 13 de Junho de 1888 — Lisboa, 30 de Novembro de 1935) é um poeta plural, cujas criações literárias têm diferentes conceitos de vida e estilos próprios - os Heterónimos. Porém este não abdicou do seu próprio ser, produzindo, entre uma obra vasta e complexa, um grande conjunto de poemas líricos com o seu legítimo nome na autoria, onde é marcada a angustiada procura pela decifração filosófia e racional do enigma do ser e da vida, que tem como resultado a fragmentação do eu de Pessoa, tendência desde cedo presente devido à sua facilidade em criar um mundo fictício em seu torno, e a criação da teoria do fingimento poético, onde afirma que a base da arte é a expressão da emoção intelectualizada, transformação essa através da memória; Porém a excessiva inquietação racional leva-o a uma infelicidade perpétua, a uma dor de pensar e a uma profunda saudade da sua infância perdida em que era inconscientemente feliz. Deste modo o seu único refúgio é constituído pela tal nostalgia e pelos sonhos.
Linhas temáticas fundamentais
[editar | editar código-fonte]Decifração do enigma do ser
[editar | editar código-fonte]A procura angustiada pela própria identidade, uma verdade intangível devido à sua pluralidade no ser,[1] pois tendo muitos indivíduos fechados em si mesmo, torna-se ninguém.[2]
Fragmentação do eu
[editar | editar código-fonte]Perante o confronto do seu ser plural, cria a fragmentação do eu como a solução para o encontro de consigo mesmo, da sua auto-descoberta, uma vez que Ser um é cadeia,/Ser eu não é ser.[3] No entanto, é um caminho sem retorno e os fragmentos do espelho quebrado da sua alma nunca lhe revelarão a sua unidade, a sua identidade perdida.[4]
Tédio existencial
[editar | editar código-fonte]A interrogação filosófica incessante acerca do mistério da vida, e por consequente do seu próprio ser, leva-o a um estado de melancolia, de desalento, de um profundo cepticismo e de angústia e tédio existenciais por saber que esta é irrespondível e torna-se incapaz de viver a vida, acrescentando-lhe ainda a solidão interior.
Sonho
[editar | editar código-fonte]Insatisfeito com o presente e, devido à fragmentação, incapaz de atingir a felicidade tão desejada, Pessoa sente que tudo é do outro lado[5] - mesmo o próximo é sentido como longínquo -, e impelido pela sua permanente inquietação, recorre ao sonho como fuga da realidade -é onde existem coisas impossíveis e memórias de uma infância impossível-; mesmo estando consciente que os sonhos são dores,[6] porque tem a consciência que os sonha, e que não é com ilhas do fim do mundo,/(...)/ que cura a alma do seu mal profundo.[7]
Nostalgia da infância
[editar | editar código-fonte]Sente uma grande saudade pela infância irremediavelmente perdida pois esta remete para o tempo em que era feliz inocentemente sem saber que o era, porque ainda não se tinha procurado e, por isso, não se tinha fragmentado. Assim essa criança que foi é agora símbolo da inconsciência, do sonho e da felicidade longínqua como a pobre ceifeira que canta[8] ou o gato que brinca na rua,[9] cujas inconscientes felicidades o poeta inveja porque já não consegue senti-la sem pensar nela e, por isso, deixa de a sentir na totalidade.
Dor de Pensar
[editar | editar código-fonte]A procura exaustiva da racionalidade e do conhecimento através da inteligência, que causa a intelectualização da sensação[10] tem como preço a sua trituração mental[11] e a inacessibilidade da felicidade.
Fingimento Poético
[editar | editar código-fonte]Para Pessoa, a verdadeira emoção artística[12] é aquela que foi intelectualizada. Deste modo procura escrever não no momento da emoção, mas no momento da recordação dela, uma vez que é na recordação, única parte da inteligência,(...) que pode conservar uma emoção.[12] Assim o poeta finge apenas emoções imaginadas, sentidas no intelecto,[12] afirmando que toda a arte é, não a insinceridade, mas sim uma sinceridade traduzida.[12]
Linhas formais
[editar | editar código-fonte]Contém uma intensa musicalidade, devido à curta métrica, ao uso frequente da quadra e às repetições - características tradicionais da lírica lusitana popular. Utiliza também um vocabulário simples mas sóbrio e com um tom espontâneo que oscila entre o interrogativo, negativo e o irónico. Está presente uma linguagem fortemente simbólica pelo recurso a imagens-símbolos e com abundantes metáforas inesperadas e desconcertantes paradoxos que aludem à racionalidade excessiva.
Síntese
[editar | editar código-fonte]Aspectos temáticos | Aspectos formais | |
---|---|---|
Obsessão pela auto-análise; | Linguagem simples e sóbria; | |
Desconhecimento de si mesmo; | Influências da lírica tradicional; | |
Ansiedade metafísica; | Musicalidade; | |
Fragmentação do eu; | Recurso de imagens-símbolo; | |
Constante inadaptação à vida; | Uso de metáforas e paradoxos; | |
Tédio, angústia existencial, náusea, solidão interior, melancolia; | Uso de repetições e reticências; | |
Evocação da infância como símbolo da felicidade perdida; | ||
Distância entre sonho e realidade; | ||
Intelectualizão dos sentimentos; | ||
Fingimento poético; | ||
Sofrimento resultante da dor de pensar; |
Referências
- ↑ Não sei quem sou, que alma tenho; Nunca me vi nem achei
- ↑ Não sei quantas almas tenho
- ↑ Sou um evadido, (13-14)
- ↑ Torno-me eles e não eu
- ↑ Contemplo o que não vejo, (9)
- ↑ Não sei, ama, onde era,, (15)
- ↑ Não sei se é sonho, se realidade,, (19-21)
- ↑ Ela canta, pobre ceifeira
- ↑ Gato que brincas na rua
- ↑ Fernando Pessoa, Páginas Íntimas e de Auto-Interpretação, 1916, Ática.
- ↑ Jacinto do Prado Coelho, Diversidade e Unidade em Fernando Pessoa, Verbo.
- ↑ a b c d Fernando Pessoa, Páginas de Estética e de Teoria e Crítica Literárias, Ática.
Bibliografia
[editar | editar código-fonte]- Fernando Pessoa (2009). Obra Completa de Fernando Pessoa. [S.l.]: Círculo de Leitores
- Fernando Pessoa. Escritos Autobiográficos, Automáticos e de Reflexão Pessoal. [S.l.]: Assírio & Alvim
- Fernando Pessoa. Páginas de Estética e de Teoria e Crítica Literárias. [S.l.]: Ática
- Lopes, Teresa Rita (1991). Pessoa por Conhecer. [S.l.]: Ed. Estampa. ISBN 9789723307689
- Lourenço, Eduardo (1993). Fernando, Rei da Nossa Bavieira. [S.l.]: I.N - C.M. ISBN 9789722706551
- Padrão, Maria da Glória (1981). A Metáfora em Fernando Pessoa. [S.l.]: Ed. Limiar
- Prado Coelho, Jacinto do (2008). Diversidade e Unidade em Fernando Pessoa. [S.l.]: Verbo. ISBN 9789722226110
- Prado Coelho, Jacinto do. "Sobre as Ideias Estéticas de Fernando Pessoa" in A Letra e o Leitor. [S.l.]: Moraes Ed.
Ligações externas
[editar | editar código-fonte]- «Casa Fernando Pessoa»
- «Multipessoa - Instituto de Estudos de Modernismo»
- «Arquivo Pessoa - Instituto de Estudos de Modernismo»
- «Pessoa revisitado»
- «Obra Completa em ordem alfabétcia - Jornal de Poesia»
- «Clube Port. na Net: Análise de poemas»
- «Em Discurso directo II: Análise de poemas»
- «Prof2000: Fernando Pessoa Ortónimo»
- «Um Fernando Pessoa: Análise de poemas»
- «Edusurfa:Resumo de Fernando Pessoa - Ortónimo» (PDF)
- «Edusurfa: Teste Diagnóstico Ortónimo nº1»
- «Edusurfa:Teste Diagnóstico Ortónimo nº2»
- «Edusurfa:Teste Diagnóstico Ortónimo nº3»
- «Edusurfa:Teste Diagnóstico Ela canta, pobre Ceifeira»
- «Edusurfa:Teste Diagnóstico Ortónimo e Heterônimos»