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Raizal
Meninos raizais em trajes típicos
População total

30 565 (2015)

Regiões com população significativa
 Colômbia (Santo André, Providência e Santa Catarina) 30118 [1]
Línguas
Crioulo sanandresano, inglês e espanhol
Religiões
Protestantismo e Catolicismo
Grupos étnicos relacionados
Afro-colombianos, Jamaicanos e Misquitos

Os raizais é a maneira como se define a cultura característica própria do Arquipélago de Santo André, Providência e Santa Catarina. Embora também sejam conhecidos como sanandresanos, o fato é que o adjetivo corresponde a um grupo mais diverso que inclui os imigrantes das ilhas durante o século XX. Os raizais em câmbio compreendem aqueles que têm uma identidade definida baseada em sua história, suas manifestações culturais, sua língua (o crioulo sanandresano) e sua identidade. Os raizais sustentam uma forte relação cultural com os povos antilhanos como a Jamaica e o Haiti. De acordo com os dados do Departamento Administrativo Nacional de Estatísticas da Colômbia de 2005, os raizais somam 40.201 pessoas no departamento, os quais correspondem a 56,98% da população total. De acordo com os estudos da socióloga Adelaida Cano Schütz,[2] a cultura raizal é um discurso construído a partir de 1991 quando o Estado colombiano reconheceu a existência e identidade deste povo. Nos últimos tempos, têm defendido a sua identidade como povo indígena, uma categoria que permitiu maiores possibilidades de defesa cultural em relação ao Estado e em relação à comunidade internacional. A palavra "raizal" surgiu em meados de 1991 e nasceu dos discursos de defesa dos direitos raizais e foi criada com o intuito de diferenciar a população original das ilhas dos grupos provenientes das imigrações dos séculos XX da Colômbia continental. Alguns estudiosos do tema concluem que o referido termo não leva em conta a evidente miscigenação e que exclui aos demais insulanos. Os raizais sanandresanos guardam uma estreita relação com os indígenas da Costa dos Mosquitos, no oriente nicaraguense.

A gênese do povo raizal se apresenta a partir do século XVII quando os britânicos decidiram se estabelecer nas ilhas, que foram ignoradas pela Espanha. Os britânicos deram início às plantações de tabaco e algodão para o qual começaram a trazer escravos africanos, especialmente os das colônias inglesas do mar do Caribe. Os britânicos, obviamente, impuseram a língua inglesa e sua religião, no entanto, os escravos africanos mantiveram seus dialetos. O inglês era utilizado na liturgia, na igreja, enquanto que a língua ancestral seria utilizada dentro do âmbito familiar. Todavia, há uma rápida fusão de línguas que, no entanto, preserva suas raízes africanas, tendo como exemplos o cuá com o axante, o jeje e o ibo e também as línguas mende e mandinga.

Até o final do século XVIII, a Espanha começa a reconquista das ilhas, mas permite que os ingleses permaneçam sob promessa de fidelidade à Coroa. Assim, as ilhas manteriam uma forte relação com o mundo antilhano anglófono que contribuiria com a formação de sua cultura e com as comunidades indígenas da Costa dos Mosquitos. Em 1845, foi construída a Igreja Batista que teria um papel importante na formação da cultura raizal e que era a autoridade autêntica organizacional nas ilhas naquela época.

Com as batalhas pela independência da Espanha, nas primeiras décadas do século XIX, a Colômbia garantiu a soberania política sobre as ilhas, no entanto não se preocupou com uma integração cultural à vida nacional durante esse século.

Colombianização

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Ver artigo principal: Colombianização

No século XX, dois fatores fizeram com que a Colômbia se interessasse em uma integração das ilhas à vida nacional: a primeira estava assinalada com a Constituição colombiana de 1886 e a segunda com a Independência do Panamá, o que levou a um processo de assimilação cultural conhecido como colombianização, que consistia em promover o uso do castelhano e a conversão ao catolicismo com o envio de várias missões para esse fim.

Quando o momento determinante da chamada colombianização iniciou em 1953, o General Rojas Pinilla declarou San Andrés como um porto livre o que levou a uma imigração descontrolada do continente. Os continentais que se instalaram eram provenientes da Costa Atlântica, assim como os árabes colombianos. Embora a política de colombianização pretendia integrar as ilhas à vida nacional e de exercer a soberania, este processo não fez nada a mais, o que criou um conflito que afetou a cultura e identidade raizal. Os esquemas econômicos, sociais e políticos trazidos pelos continentais de base hispanista e católica, segregaram as estruturas que os raizais já tinham durante séculos antes. Esse conflito causaria ressentimento em vez de alcançar o esperado e introduziria duas classes sociais: os ilhéus nativos (raizais) e os continentais (nomeado por eles como campanha) e o primeiro com um sentimento de marginalização em sua própria terra. Em contrapartida, começou a apresentar o problema da superpopulação e escassez de recursos, que é atualmente uma das principais dificuldades da ilha de San Andrés como um dos mais densamente povoados do mundo: mais de 70 mil pessoas vivem no espaço de 44 quilômetros quadrados, ou seja, mais de 1.500 pessoas por quilômetro quadrado.

O processo de colombianização apresentado no século XX foi fortemente criticado como sendo um processo que desconhecia a identidade do povo nativo, o qual tinha um sistema social, político e cultural próprio e, por outro lado, a colombianização de fato se deu sem a participação do povo raizal, de modo que foi um processo de preferência unilateral.

Processo de reconstrução raizal

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A Constituição da Colômbia de 1991 pode ser vista como o fim do processo de colombianização e o início de um processo oposto denominado construção da identidade étnica. A nova constituição estabeleceu um novo regulamento nacional que reconhecia, promovia e protegia as minorias étnicas colombianas e em especial foi reconhecido um estatuto cultural para o povo raizal. Graças a esse ato, iniciou-se o chamado "processo de reconstrução da identidade raizal".

Portanto, a Constituição permitiu que as diferenças culturais, que estavam presentes há vários anos nas ilhas, tivessem um substrato legal, e também permitiu que os raizais começassem a lutar por seus direitos, hoje como uma minoria étnica definida e diferente do resto dos habitantes sanandresanos.[3]

Embora se parta do princípio de que a cultura raizal se baseia na protestante, o certo é que muitos ilhéus nativos (raizais) se tornaram católicos dentro do processo anterior de colombianização e, portanto, estudiosos da cultura definiram que o importante é a fé e a religião vividas com retidão dentro da sua igreja.

...isso é algo que está nas veias. E Deus é o centro onde giram todas as coisas, a família, mas não um Deus como gostaríamos que fosse... o fato é Deus, um elemento divino, um elemento transcedental, um elemento superior, que desempenha um papel, que seja mentalmente assim no componente raizal."[4]

No entanto, a importância dos pastores batistas dentro da estrutura cultural raizal é indiscutível e segundo a socióloga, estes foram fundamentados especialmente no pastor Martin Luther King como reivindicador dos direitos de seu povo.

Outro elemento fundamental é a língua, o crioulo sanandresano, o que tem sido dado a devida importância como elemento de identidade. Mas isto não foi sempre assim. A realidade das ilhas é a presença de três línguas que fazem parte da vida das pessoas em sua própria maneira: o inglês introduzido pelos britânicos desde o século XVII, o castelhano introduzido pelos colombianos desde o século XX e o crioulo sanandresano, inglês crioulo ou creole. Paradoxalmente, antes da constituição de 1991, o sanandresano sofreu um tipo de marginalização por parte dos mesmos raizais, os quais tinham um idioma "inferior" ou de crianças, enquanto o "correto" seria falar inglês e ressaltar a descendência britânica acima da africana.

No entanto, por muitas décadas, o inglês crioulo foi visto com desdém pelos Ilhéus por ter raízes africanas, assim como o inglês; era considerado como a língua das classes mais baixas, e era rejeitado a sua utilização nas escolas e nas igrejas (Dittman, 1992, citado por A.Cano).[5]

Acerca disso, relata a historiadora e escritora sanandresana Hazel Robinson:

Boa língua, o crioulo. Mas o crioulo era, é um dialeto africano com misturas do inglês elisabetano, mas isso as pessoas falavam... ou não... Primeiramente, nas igrejas não falavam, porque Deus não entende crioulo, então na igreja tinha que falar um inglês muito formal (...) e existem casas aqui que até hoje não fala crioulo. Outras casas sim. O crioulo era como a língua da rua, das crianças, mas entre pessoas que não se consideravam com certa educação.[6]

Com o início do processo de reconstrução raizal, o crioulo sanandresano foi posto dentro dos elementos culturais a defender, mas, nesse sentido, existe dentro dos mesmos raizais pontos de vistas divergentes como aqueles que vêm a promoção do uso do inglês e do castelhano como mais úteis para o seu desenvolvimento.

Normalmente se pensa do raizal como um povo de raça negra e de origem africana, mas este é outro elemento que se desconhece da cultura raizal, formada também por um forte elemento britânico. Nem todos os raizais são negros e o sistema legislativo colombiano pretendeu reger em San Andrés e que inclui aos raizais dentro da categoria de afro-colombianos, tem sido sistematicamente ignorado por eles mesmos. O que não pode ser ignorado, é que os raizais defendem seu elemento britânico mais que o africano, como conta a socióloga Cano:

A sociedade da ilha neste período foi identificada com padrões culturais deixados pelos ingleses e mantidos durante várias décadas de contato com as outras ilhas de língua inglesa, com Estados Unidos e Inglaterra. Esta identificação da ilha de frente para a cultura anglo-saxã foi transmitida de geração em geração e foi isso que recriou o universo cultural do ilhenho. Neste sentido, a música ou a comida possuem altos componentes ingleses, enquanto que o africano, ou o que pode ter vestígios de este é rejeitado, por ser considerado "primitivo" (Clemente, 1991, citado por Cano).[7]

Depois de seu reconhecimento como etnia na Constituição de 1991, os raizais iniciaram um processo de definição do que isso significa e as implicações sociais e jurídicas no contexto nacional colombiano. Desta forma, veio a um conceito mais complexo: determinou que eles são um povo indígena, conforme definido na Convênio 169[8] que estabelece os seguintes critérios para reconhecer um povo como indígena:

  1. Aqueles cujas condições sociais, culturais e econômicas são diferentes da comunidade nacional e estão regidas por costumes e tradições próprias ou por legislações especiais.
  2. Aqueles que descendem de populações que habitavam o território antes da conquista ou colonização, ou antes do estabelecimento das fronteiras atuais.
  3. Para estar ciente de sua própria identidade tribal e cultural.

Desta forma os raizais acolheram-se a este convênio internacional e ao adquirir o status de indígenas, garantiram ainda mais a defesa de sua identidade étnica.

Outros aspectos culturais

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Outros aspectos culturais descritivos do raizal são sua moradia e sua música. A habitação raizal está relacionada à habitação tradicional das Antilhas Inglesas de cores vivas, de madeira e uma combinação de estilos ingleses e africanos. O mesmo vale para a música que pertence de alguma forma às manifestações das Antilhas e particularmente às da Jamaica, país este que exerce uma grande influência cultural sobre a população. No entanto, através do contato direto com a imigração colombiana do continente durante o século XX, San Andrés recebeu uma grande influência cultural especialmente da região do Caribe na Colômbia, muitos dos quais construíram edifícios de azulejos, hotéis e deram outro aspecto menos nativo para muitos setores, especialmente na ilha de San Andrés.

Referências

  1. Erro de citação: Etiqueta <ref> inválida; não foi fornecido texto para as refs de nome https://www.dane.gov.co/files/censo2005/etnia/sys/colombia_nacion.pdf
  2. A. Cano Schütz: Los raizales sanandresanos, realidades étnicas y discurso político.
  3. Idem, A. Cano Schütz, p.5
  4. Entrevista de Cano ao sacerdote católico Marcelino Hudgson em 9 de julho de 2003, em "Los raizales sanandresanos", p. 5
  5. Idem, p. 8
  6. Robinson en entrevista con Cano, Idem, p.14.
  7. Idem, p. 14
  8. OIT, sobre los pueblos indígenas, Lima, 1989.
  • CANO SCHÜTZ, Adelaida (Maio de 2005). Los raizales sanandresanos: realidades étnicas y discurso político. [S.l.]: Bogotá: Colombia.Indymedia.org 
  • Convenio OIT Nro. 169 sobre pueblos indígenas y tribales en países independientes. [S.l.]: Lima. 1989 
  • MEDELLÍN BECERRA, José Alejandro y Diana Fajardo Rivera (2005). Diccionario de Colombia. [S.l.]: Bogotá, Editorial Norma 

Ligações externas

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