Reinaldo de Châtillon – Wikipédia, a enciclopédia livre
Reinaldo de Châtillon | |
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Reinaldo tortura o patriarca Aimeri de Limoges | |
Príncipe da Antioquia | |
Reinado | 1153 a 1160 |
Coroação | 1153 |
Antecessor(a) | Raimundo da Antioquia |
Sucessor(a) | Constança de Antioquia |
Nascimento | c. 1124 Châtillon-sur-Loire, Loiret, França |
Morte | 4 de julho de 1187 (63 anos) Hatim, Palestina |
Cônjuge | Constança de Antioquia Estefânia de Milly |
Descendência | Inês de Antioquia Joana de Châtillon Reinaldo de Châtillon II Alice de Châtillon |
Casa | Casa de Châtillon |
Pai | Hervé II de Donzy |
Religião | Católico |
Reinaldo de Châtillon ou Reginaldo de Chastillon (Renaud de Châtillon em francês) (c. 1124 – 4 de julho de 1187) foi um cavaleiro que serviu na Segunda Cruzada e permaneceu na terra santa após a sua derrota. Personagem controverso, governou como príncipe de Antioquia de 1153 a 1160, e através do seu segundo casamento tornou-se senhor da Transjordânia e de Hebrom.
Príncipe de Antioquia
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Não há certeza sobre as origens de Reinaldo de Châtillon:
- O historiador francês Du Cange, no século XVII, acreditava que o cavaleiro era originário de Châtillon-sur-Marne, na província de Champanhe ;
- Segundo Jean Richard[1] e Pierre Aubé,[2] era filho de Hervé II de Donzy e herdara Châtillon-sur-Loing (actual Châtillon-Coligny) antes de aderir à Segunda Cruzada em 1147;
- Segundo outras fontes, era o segundo filho de Henrique I de Châtillon, senhor de Châtillon-sur-Loing, com a sua esposa Ermengarda de Montjay, senhora e herdeira de Montjay .[3]
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Ao chegar ao Oriente, entrou ao serviço de Constança de Antioquia (r. 1131–1160), cujo primeiro marido morrera em 1149. Constança casou-se em segredo com Reinaldo em 1153, sem consultar o seu primo e suserano Balduíno III de Jerusalém (r. 1143–1162). Tanto o rei de Jerusalém como o patriarca latino de Antioquia, Amalrico de Limoges, desaprovaram a escolha da princesa, devido à linhagem inferior de Reinaldo.
Em 1155, com o pretexto de que o Imperador Manuel I Comneno (r. 1143–1180) renegara a promessa que lhe fizera de pagar uma soma em dinheiro pelos seus serviços militares contra o príncipe Teodoro II da Arménia (r. 1140–1169), Reinaldo prometeu atacar o território bizantino de Chipre em retaliação. Quando o patriarca de Antioquia se recusou a financiar esta expedição, o príncipe aprisionou-o e torturou-o: despido, as suas feridas foram cobertas com mel e foi colocado no topo da cidadela, exposto aos insectos e ao sol ardente do Levante. Quando foi libertado, Amalrico de Limoges desfaleceu de exaustão e concordou em financiar a expedição de Reinaldo.
Aliado ao seu antigo inimigo Teodoro, Reinaldo derrotou as defesas bizantinas sem dificuldades e depois assolou sistematicamente a ilha: campos agrícolas foram queimados, soldados massacrados, igrejas, palácios e conventos pilhados e incendiados, mulheres estupradas, velhos e crianças degolados, os homens ricos presos para a obtenção de resgates e os pobres decapitados. Antes de sair do Chipre com os seus despojos, Reinaldo reuniu todos os padres e monges gregos - cortou-lhes os narizes e enviou-os a Constantinopla.
Mesmo numa época em que a pirataria contra Bizâncio era comum, a violência deste ataque foi registrada com particular indignação pelos cronistas. Muito rapidamente, o príncipe de Antioquia tornou-se odiado pelos seus vizinhos muçulmanos de Alepo, pelos bizantinos e pelos seus próprios súbditos. Durante os três anos após o ataque ao Chipre, Reinaldo manteve-se ao lado do rei Balduíno III de Jerusalém nos vários combates contra as forças muçulmanas, o que lhe permitiu reconquistar a fortaleza de Harim a Noradine (r. 1146–1174) em 1158.
Entretanto, o imperador Manuel I Comneno, forçado a abandonar as suas ambições no Mediterrâneo ocidental, ficou com recursos para intervir no Oriente. Os príncipes cruzados do Levante desejavam aliar-se ao imperador e Balduíno III de Jerusalém casou-se com a sua sobrinha.
O bizantino reuniu um exército poderoso, reconquistou a Cilícia aos arménios, como represália pela participação do príncipe Teodoro II da Arménia no ataque a Chipre, e passou o Inverno a 150 quilómetros de Antioquia. Isolado, Reinaldo de Châtillon sabia que os outros príncipes cruzados desaprovaram a sua conduta no Chipre e que não teria ajudas contra Manuel I. Deste modo, viu-se forçado a implorar, prosternado, de pés nus e com uma corda ao pescoço, o perdão do imperador.
Como contrapartida pela sua clemência, em Abril de 1159, o bizantino entrou pacificamente em Antioquia para receber o juramento de vassalagem do Principado de Antioquia ao Império Bizantino, e a promessa do príncipe de aceitar um patriarca grego na sua cidade. No ano seguinte, quando o imperador veio encontrar-se com o rei Balduíno III de Jerusalém, Reinaldo foi teve de fazer o ato simbólico de conduzir o cavalo de Manuel para dentro da cidade.
Pouco depois deste encontro, a 23 de novembro de 1160, o príncipe de Antioquia foi capturado pelos muçulmanos durante uma expedição de pilhagem contra os sírios e arménios nas proximidades de Marache. Ficou aprisionado por Noradine em Alepo durante 16 anos. Durante o seu cativeiro, Constança de Antioquia morreu e Boemundo III de Antioquia (r. 1163–1201), filho do primeiro casamento desta com Raimundo de Poitiers (r. 1136–1149), assumiu o governo do principado.
Reinaldo foi libertado em 1176 por Sale Ismail Maleque, filho de Noradine. Segundo algumas fontes isto ocorreu numa numa troca de prisioneiros; outras fontes afirmam que, por ser padrasto da imperatriz Maria de Antioquia, foi resgatado por Manuel Comneno pela exorbitante quantia de 120 000 dinares (500 quilos) de ouro.
Apogeu
[editar | editar código-fonte]Reinaldo serviu como enviado do rei Balduíno IV de Jerusalém (r. 1174–1185) ao imperador Manuel I Comneno. Uma vez que a sua esposa Constança de Antioquia morrera em 1163, foi-lhe cedido um matrimónio vantajoso com Estefânia de Milly, a abastada viúva de Onofre III de Toron e Miles de Plancy, e herdeira do Senhorio da Transjordânia, incluindo os castelos de Queraque e Montreal, a sudoeste do mar Morto. Estas fortalezas controlavam as rotas de comércio entre o Egito e Damasco e davam acesso ao mar Vermelho.
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O longo período que passara aprisionado não apaziguaram o nobre impetuoso, que continuou a somar provocações a todos os poderes da região - bizantinos, muçulmanos e latinos. Aliado aos Templários, exercia uma forte influência sobre a corte de Jerusalém. Era partidário de uma política de conquista face aos muçulmanos, mais motivada pelo espólio das pilhagens do que por considerações estratégicas. Mais uma vez o nobre se evidenciou pela sua crueldade, agora em Queraque, frequentemente lançando os seus inimigos e reféns das muralhas para as rochas abaixo do castelo.
Contrariamente ao que escreveram os cronistas francos, que teriam pretendido minimizar o seu papel nesta ocasião, em Novembro de 1177 esteve à frente do exército do Reino Latino de Jerusalém que derrotou Saladino (r. 1174–1193) em 25 de novembro de 1177 na batalha de Monte Gisardo,[2] na qual o líder muçulmano escapou por pouco à prisão ou morte.
Em 1181 a tentação de atacar as caravanas que passavam por Queraque foi demasiada e, apesar das tréguas acordadas entre Saladino e Balduíno IV, iniciou as pilhagens. O sultão exigiu reparações do rei de Jerusalém, mas este respondeu que se via incapaz de controlar o seu vassalo impetuoso. Em consequência, a guerra entre muçulmanos e o reino latino reiniciou em 1182.
Durante as hostilidades, Reinaldo ainda lançou navios no mar Vermelho, para iniciar actos de pirataria, mas também para ameaçar Meca e Medina, duas das cidades mais santas do Islão. Os seus piratas atacaram a costa do mar Vermelho na região de Hejaz, pilhando portos muçulmanos e chegando a atacar um barco de peregrinos muçulmanos que se dirigia para Jidá.
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Enquanto Reinaldo, carregado com os despojos, voltava para as suas terras, os seus homens continuaram os saques no mar Vermelho. A ideia por detrás dos ataques deveria parecer muito boa: ameaçar esta região criaria uma diversão útil para afastar as forças árabes do Reino de Jerusalém. Mas isto exigia mais meios e uma estratégia mais fria que Reinaldo de Châtillon, como demonstra toda a sua biografia, não possuía.
Quando Al-Adil I (r. 1200–1218), irmão de Saladino, enviou uma frota para erradicar os piratas, encontrou-os a curta distância de Medina. Conduzidos a Cairo, estes foram decapitados em público, mas Reinaldo conseguiu escapar para Moab.
A provocação de atacar os lugares santos do Islão teve como consequência a união do mundo muçulmano e o endurecimento da sua atitude contra os cristãos latinos. Em 1183, durante o casamento de Onofre IV de Toron com Isabel de Jerusalém (r. 1192–1205), Saladino impôs um cerco a Queraque, que foi levantado pelo conde Raimundo III de Trípoli (r. 1152–1187).
Reinaldo manteve uma presença discreta até 1186, quando se aliou a Sibila de Jerusalém (r. 1186–1190) e a Guido de Lusinhão (r. 1186–1194) contra Raimundo III de Trípoli, e a sua influência contribuiu para o reconhecimento de Guido como rei de Jerusalém. Apesar do conde de Trípoli e da família Ibelin tentarem promover a subida ao trono da princesa Isabel de Jerusalém, Onofre IV manteve-se leal ao partido do padrasto e de Guido.
Pouco depois, Reinaldo atacou uma caravana que viajava entre Cairo e Damasco, violando a trégua entre Saladino e os cruzados. No ano seguinte o líder muçulmano enviaria um exército para proteger uma outra caravana (em Março de 1187), na qual viajava uma irmã sua, regressando de uma peregrinação a Meca. Algumas crónicas posteriores, como as continuações da Historia de Guilherme de Tiro no século XIII, confundiram estes dois eventos e afirmaram erroneamente que uma irmã, tia ou mesmo a mãe de Saladino, tinha sido aprisionada pelos cristãos, mas estes relatos são contraditos por fontes árabes como Abu Xama e ibne Alatir.
Guido de Lusinhão repreendeu Reinaldo pelos ataques, numa tentativa de aplacar Saladino, mas o nobre respondeu que era senhor das suas próprias terras e que não acordara qualquer paz com o muçulmano. Por sua vez, Saladino fez um juramento de cortar a cabeça de Reinaldo se alguma vez o aprisionasse.
Derrota e morte
[editar | editar código-fonte]Em 1187, Saladino invadiu o Reino de Jerusalém, derrotando os cruzados a 4 de Julho na batalha de Hatim e fazendo um grande número de prisioneiros, entre os quais Reinaldo de Châtillon e Guido de Lusinhão. Ambos foram conduzidos à tenda do sultão onde, segundo os acontecimentos presenciados e relatados pelo cronista Imadadim de Ispaã:
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“ | Saladino convidou o rei [Guido] a sentar-se ao seu lado, e quando Arnate [Reinaldo] por sua vez entrou, sentou-o ao lado do seu rei e lembrou-o das suas más acções. "Quantas vezes vós fizestes uma promessa e a violastes? Quantas vezes vós assinastes acordos que nunca respeitastes?" Reinaldo respondeu através de um tradutor: "Os reis sempre agiram assim. Eu não fiz nada mais." Durante isto, o rei Guido arquejava com sede, a sua cabeça balançando como se estivesse ébrio, o seu rosto traindo grande medo. Saladino disse-lhe palavras tranquilizadoras, e mandou trazer água fresca, que lhe ofereceu. O rei bebeu, depois passou o restante a Reinaldo, que então saciou a sua sede. O sultão então disse a Guido: "Não pedistes permissão antes de lhe dardes água. Deste modo, não sou obrigado a conceder-lhe misericórdia." Depois de pronunciar estas palavras, o sultão sorriu, montou no seu cavalo e saiu, deixando os cativos em terror. Supervisionou o regresso das tropas e depois voltou à sua tenda. Ordenou que lhe trouxessem Reinaldo, depois avançou sobre ele, de espada em punho, e atingiu-o entre o pescoço e a omoplata. Quando Reinaldo caiu, cortou-lhe a cabeça e arrastou o corpo pelos pés até ao rei, que começou a tremer. Vendo-o assim perturbado, Saladino lhe disse em um tom tranquilizador: "Este homem só foi morto por causa da sua maleficência e perfídia". | ” |
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Guido de Lusinhão foi poupado e conduzido a Damasco, onde ficou algum tempo até ser libertado.
Para alguns cristãos da sua época, Reinaldo foi considerado um mártir morto às mãos dos muçulmanos. No entanto, a documentação histórica tende a refutar esta imagem idealizada, passando a impressão de este nobre ser um pirata salteador que pouco se preocupou com o bem do Reino de Jerusalém.
É possível até argumentar que os sucessos do reino latino foram desfeitos em larga medida pela imprudência de Reinaldo, que teria provocado desnecessariamente os estados muçulmanos ao redor do Ultramar, incitando-os à jihad e a criarem uma frente comum que erradicaria toda a presença ocidental no Levante.
Casamentos e descendência
[editar | editar código-fonte]Do seu casamento em 1153 com Constança de Antioquia, Reinaldo teve uma filha:
- Inês de Antioquia (m. 1184), casada com o rei Bela III da Hungria.
Casado em segundas núpcias em 1177 com Estefânia de Milly, teve outra filha:
- Alice de Châtillon (m.1235), casada com Azão VI d'Este (que talvez fosse filha de Constança e não de Estefânia[3]).
Na cultura
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- A c. 1200, Pedro de Blois escreveu uma crónica da morte de Reinaldo na obra Passio Raginaldi principis Antiochae.
- No romance The Knights of Dark Renown (1969), Graham Shelby refere-se a este cruzado como o malévolo Lobo vermelho de Queraque.
- No filme egípcio El Naser Salah el Dine de Youssef Chahine (1963), é mais uma vez retratado negativamente.
- Na série de romance histórico Knights Templar Trilogy do sueco Jan Guillou, Reinaldo é um vilão conspirativo, incompetente e egoísta, que acelera o processo da perda da terra santa para Saladino.
- Foi também personagem principal do romance histórico Renaud de Châtillon, Satan des Francs ou la Colère d'Allah, de Jacques Thoquet.
- Uma versão muito ficcionalizada[4] deste príncipe é representada por Brendan Gleeson no filme de 2005 Kingdom of Heaven.
- Reinaldo é um NPC no jogo de computador Age of Empires: The Age of Kings , como um dos nêmesis de Saladino.
- Também surge como NPC no jogo de computador Baldur's Gate 2.
- É um dos vilões no video-jogo Assassin's Creed.
Bibliografia
[editar | editar código-fonte]- L'Empire du Levant: Histoire de la Question d'Orient, René Grousset, 1949
- The Crusades Through Arab Eyes, Amin Maalouf, 1984 (ISBN 0-8052-0898-4)
- Encyclopædia Britannica, 11ª edição, 1911
- The Elephant of Christ: Reynald of Châtillon, Bernard Hamilton, Studies in Church History 15 (Oxford, 1978), pp. 97–108
- The Leper King and His Heirs, Bernard Hamilton, 2000
- Petri Blesensis tractatus duo: Passio Raginaldi principis Antiochie, Conquestio de dilatione vie Ierosolimitane, Pedro de Blois, ed. R.B.C Huygens, in Corpus Christianorum Continuatio Mediaevalis vol. CXCIV, 2002
- A History of the Crusades: Volume 2, The Kingdom of Jerusalem and the Frankish East, Steven Runciman, 1952
Referências
- ↑ Aux origines d'un grand lignage: des Palladii à Renaud de Châtillon, Jean Richard, Media in Francia: Recueil de mélanges offert à Karl Ferdinand Werner, Institut historique allemand, Maulévrier, 1989
- ↑ a b Un Croisé contre Saladin, Renaud de Châtillon, Pierre Aubé, Fayard, Paris, 2007 (ISBN 978-2-213-63243-8)
- ↑ a b «Dinastia de Châtillon» (em francês)
- ↑ «Kingdom of Heaven - Personnages du film et la réalité historique» (em francês)
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