Campeonato Brasileiro de Clubes Campeões de 1920 – Wikipédia, a enciclopédia livre

Campeonato Brasileiro de Clubes Campeões
Torneio dos Campeões (CBD)

Jornal do Brasil, 29 de março de 1920, p.10: "O quadro do C.A. Paulistano, vencedor do Fluminense".
Dados
Participantes 03
Organização CBD
Anfitrião Estádio das Laranjeiras, Rio de Janeiro
Período 25 de março3 de abril de 1920
Gol(o)s 23
Partidas 03
Média 7,67 gol(o)s por partida
Campeão São Paulo Paulistano (1° título)
Vice-campeão Distrito Federal Fluminense
3.º colocado Rio Grande do Sul Brasil de Pelotas
Melhor marcador 4 gols:
Maior goleada
(diferença)
Paulistano 7 – 3 Brasil de Pelotas
Estádio das LaranjeirasRio de Janeiro
25 de março

O Campeonato Brasileiro de Clubes Campeões de 1920,[nota 1][1][2] também conhecido como Torneio dos Campeões, Copa/Torneio dos Campeões Estaduais ou Torneio Nacional de Clubes,[3] foi um dos primeiros campeonatos a nível interestadual no Brasil. Organizado pela Confederação Brasileira de Desportos (CBD) (precursora da atual CBF), em 1920, plena fase amadora, é tido como um dos antecedentes do Campeonato Brasileiro de Futebol.[4][1]

O jornal O Paiz, edição de 25 de março de 1920, anunciava o início do "grande interestadual promovido pela CBD", que convidou altas autoridades do país, incluindo o presidente do Brasil, Epitácio Pessoa, para acompanhar os jogos.[5] O torneio foi vencido pelo Paulistano,[6] que recebeu a "Taça Elixir de Nogueira",[nota 2] na qual continha a inscrição "Campeão Brasileiro de 1920".[7]

Segundo o setor de memória do Club Athletico Paulistano, foi a primeira competição do futebol brasileiro que envolveu mais de dois estados.[8]

Participantes

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Foram chamados os campeões estaduais de São Paulo, Rio de Janeiro (Distrito Federal) e Rio Grande do Sul:

A origem da competição relaciona-se com a controvérsia sobre a Taça Ioduran de 1919, em que Fluminense e Paulistano se enfrentariam como campeões estaduais de Rio de Janeiro e São Paulo. Esta acabou não ocorrendo, em razão de desentendimento envolvendo a Associação Paulista de Esportes Atléticos (APEA) e a carioca Liga Metropolitana de Desportos Terrestres (LMTD).[9]

O Paulistano fez críticas ao Botafogo, ao qual o zagueiro Palomone, então Mackenzie, se transferiu logo após o Sul-Americano de 1919. Isto gerou uma crise entre as instituições, conforme explica Fernandez (2016, pp. 240-241) citando Mazzoni (1950): "O clube paulista acusou o clube carioca de aliciar o jogador com ofertas financeiras, a LMDT confirmou a transferência e a APEA rompeu com essa entidade, como a CBD ficou ao lado da LMTD, a APEA também rompeu com a CBD".[9]

A APEA acabaria impedindo o Paulistano de disputar a Taça Ioduran, sob a justificativa de falta de datas, de modo que o Fluminense, não sem o descontentamento paulista, foi declarado campeão por w.o. Já em 1920, o Paulistano aceitou entregar a taça, requisitando, como condição, um novo confronto. Assim, segundo Fernandez (2016, p. 241): "Essa atitude permitiu uma trégua para a realização do primeiro campeonato brasileiro de clubes, a Copa dos Campeões (...)".[9]

Em 1917, o Paulistano também perdeu a Taça Ioduran por w.o, para o America. Em 1918, na única edição realmente jogada, foi campeão sobre o Fluminense, pelo placar de 3 a 2. A Taça Ioduran é contabilizada como Taça dos Campeões Estaduais Rio–São Paulo, a qual já havia sido realizada em 1911 (Taça Salutaris), 1912 (Troféu Interestadual) e 1914, com vitórias de outros três clubes paulistas.

Treze anos antes, em 1907, foi disputada a Taça Brasil, tira-teima de ida-e-volta entre as seleções Carioca e a Paulista, organizada pelas respectivas federações estaduais, que usaram a rubrica "Campeonato Brasileiro" na comunicação entre si. São Paulo venceu.[10]

O jornal O Estado de S. Paulo de 29 de março de 1920, divulgou que o interestadual daquele ano era um campeonato nacional, representado pelas forças máximas da associação, e que, após a vitória sobre o Fluminense, o Paulistano confirmou o seu título de "campeão brasileiro de futebol". Depois de vencer os gaúchos e cariocas, a diretoria do clube paulista voltou para casa festejando os "campeões brasileiros", recebidos com placa, banquete e medalhas.[9][11]

O Correio da Manhã, de 4 de abril de 1920, refere-se ao torneio como "Campeonato Brasileiro".[12] Em 15 de março de 1946, o jornalista Mário Filho, para O Globo Sportivo, artigo "História do Campeonato Brasileiro - 1", escreve: "Em 20, a Confederação Brasileira organizou um torneio a que deu o título de Campeonato Brasileiro"; "E, havia dois anos, a CBD crismara de 'Campeonato Brasileiro' o certame dos campeões do Rio, São Paulo e Rio Grande". Entretanto, só no primeiro campeonato de seleções envolvendo sete estados, em 1922, que a CBD passou a referir uma competição oficialmente de "Campeonato Brasileiro".[10] Segundo reportagem de Mauro Pinheiro (1976), para a Placar, "a CBD organizou o primeiro Campeonato Brasileiro de Clubes Campeões, assim rotulado, mas que acabou sendo um simples triangular (...)".[1] Em 1994, a mesma revista chamou a disputa de "avô do atual campeonato brasileiro".[2] É mais referenciada pela impressa como "Copa dos Campeões" ou "Torneio dos Campeões".[13]

As despesas foram totalmente pagas pela CBD, que precisava montar uma Seleção Brasileira para o Campeonato Sul-Americano de 1920, em outubro, no Chile, tendo o torneio como uma oportunidade de observar jogadores,[nota 3] e também de levantar fundos, visando a participação do país nos Jogos Olímpicos de Verão de 1920.[14][15]

Todos os jogos foram disputados no estádio do Fluminense, o Estádio das Laranjeiras, que fora construído para o Sul-Americano de 1919, com o apoio da CBD, sendo o maior do Brasil na época. O juiz Henrique Vignal, da Liga Metropolitana e associado do C. R. Flamengo, considerado um dos melhores juízes do futebol brasileiro, conforme O Paiz (1920), apitou a partida inaugural.[5] Arthur Friedenreich, goleador histórico, fez um hat-trick.[8]

No jogo do título contra o anfitrião Fluminense, 25 mil pessoas fizeram presença, então ocupação máxima do Estádio das Laranjeiras.[16] Houve torcida hostil ao time local, seja por torcedores de rivais cariocas ou pela própria torcida (esta última possibilidade levantada pelo O Paiz), o que chegou a ser apontado como razão da derrota e indicava o fim do cavalheirismo no futebol.[9] Em São Paulo, lia-se o confronto do Rio de Janeiro na Praça Antônio Prado, em frente ao Estadão, que a partir de tabuletas informava os lances importantes. Por telefone, um repórter no estádio descrevia a partida para a redação.[16] A vitória foi tida pela impressa paulista como representação da superioridade do futebol de São Paulo sobre o futebol da então capital brasileira.[9] O triunfo foi comemorado pelo poeta Mário de Andrade: "Os cariocas perderam o match / Quatro a um / Urrah, paulistas!".[9] Mário Filho apontou que ter um elenco envelhecido, que vinha de um tricampeonato carioca, foi a causa do insucesso do Fluminense.[10]

O Correio da Manhã (1920) discorreu sobre o último jogo da "série de jogos interestaduais" da CBD, ocorrido entre Fluminense e Brasil de Pelotas. Apesar da diferença de quatro gols em favor do dono da casa, o jornal observa que ambas equipes tiveram um desempenho superior ao que apresentaram contra o Paulistano. O periódico, que narrou cada gol e apresentou as estatísticas da peleja,[nota 4] ao final apresenta a tabela com a "colocação dos concorrentes ao título máximo do Campeonato Brasileiro".[12] Antes da partida houve uma preliminar: Serrano 5 x 1 Carioca.[12] O time gaúcho guarda em suas dependências um troféu pela participação no campeonato.[15][17]

Foi o primeiro torneio nacional do futebol brasileiro,[16] sendo sucedido pelo Campeonato Brasileiro de Seleções Estaduais (1922 a 1987) e pelo Torneio dos Campeões (1937). Este último, organizado pela FBF, também era entre clubes, mas de cunho profissional, tendo sido oficializado como Brasileirão, em 2023, pela CBF.[4][7] São competições distintas. Em 2022, o Club Athletico Paulistano, que abandonou o setor de futebol em 1929 (ainda como time amador), afirmou não ter interesse pelo mesmo reconhecimento.[7] Em 2023, disse em nota que "o tema está em avaliação pelo clube".[8]

Em 3 jogos foram marcados 23 gols, uma média de 7,6 gols por partida.

25 de março de 1920 Paulistano São Paulo 7 – 3 Rio Grande do Sul Brasil de Pelotas Estádio das Laranjeiras, Rio de Janeiro (RJ)

Arthur Friedenreich Gol marcado aos 04 minutos de jogo 04', Gol marcado aos 17 minutos de jogo 17', Gol marcado aos 29 minutos de jogo 29'
Mário Andrade Gol marcado aos 11 minutos de jogo 11', Gol marcado aos 25 minutos de jogo 25'
Carlos Araujo Gol marcado aos 54 minutos de jogo 54', Gol marcado aos 64 minutos de jogo 64'
Ignácio Gol marcado aos 42 minutos de jogo 42'
Proença Gol marcado aos 78 minutos de jogo 78'
Alberto Côrrea Gol marcado aos 82 minutos de jogo 82'
Público: ?
Árbitro: Henrique Vignal
28 de março de 1920 Fluminense Distrito Federal 1 – 4 São Paulo Paulistano Estádio das Laranjeiras, Rio de Janeiro (RJ)

Zezé Gol marcado aos 02 minutos de jogo 02' Arthur Friedenreich Gol marcado aos 40 minutos de jogo 40'
Mário Andrade Gol marcado aos 50 minutos de jogo 50', Gol marcado aos 89 minutos de jogo 89'
Botelho Gol marcado aos 69 minutos de jogo 69'
Público: 25,000
Árbitro: Eduardo Gibson
3 de abril de 1920 Fluminense Distrito Federal 6 – 2 Rio Grande do Sul Brasil de Pelotas Estádio das Laranjeiras, Rio de Janeiro (RJ)

Machado Gol marcado aos 16 minutos de jogo 16', Gol marcado aos 77 minutos de jogo 77'
Zezé Gol marcado aos 43 minutos de jogo 43', Gol marcado aos 53 minutos de jogo 53', Gol marcado aos 75 minutos de jogo 75'
Harry Welfare Gol marcado aos 83 minutos de jogo 83'
Proença Gol marcado aos 63 minutos de jogo 63'
Alvariza Gol marcado aos 86 minutos de jogo 86'
Público: ?
Árbitro: Carlos Santos

Classificação final

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Triangular final
Times Pts J V E D GP GC SG
São Paulo Paulistano 4 2 2 0 0 11 4 +7
Distrito Federal Fluminense 2 2 1 0 1 7 6 +1
Rio Grande do Sul Brasil de Pelotas 0 2 0 0 2 5 13 -8
Campeonato Brasileiro de Clubes Campeões
São Paulo
Paulistano
Campeão
(1.º título)
  • Arthur Friedenreich (Paulistano), Mário Andrade (Paulistano) e Zezé (Fluminense): 4 gols
  • Carlos Araujo (Paulistano), Machado (Fluminense) e Proença (Brasil de Pelotas): 2 gols

Notas e referências

Notas

  1. A CBD nunca rotulou oficialmente as suas competições de clubes com a nomenclatura "Campeonato Brasileiro". Com a criação da CBF, a nova entidade passou a rotular assim a principal disputa de clubes do país no final da década de 1980.
  2. Elixir de Nogueira era um elixir fabricado em um edifício de mesmo nome demolido em 1970.
  3. Ainda em razão da controvérsia sobre a Taça Ioduran, a APEA negou a convocação de jogadores paulistas para o Sul-Americano de seleções.[9] Do Fluminense, a Seleção Brasileira convocou José Carlos Guimarães, Ayrton Bacchi e Agostinho Fortes Filho, além de Oswaldo Gomes, jogador tricolor no triangular, que tornou-se treinador do selecionado nacional; do Brasil de Pelotas, Ismael Alvariza e Constantino Mollitsas.
  4. O jornal errou no subtítulo (linha fina), afirmando que o Fluminense derrotou o G. S. Brasil por 6 a 0. Ao longo da matéria, porém, acerta o placar e até detalha os dois gols pelotenses.

Referências

  1. a b c Pinheiro, Mauro (14 de maio de 1976). Primeiro título nacional ficou com o Paulistano. [S.l.]: Revista Placar; Editora Abril. Ano de 1920, ainda em pleno amadorismo, a CBD organizou o primeiro Campeonato Brasileiro de Clubes Campeões (...) 
  2. a b Épocas de Ouro. [S.l.]: Placar Magazine; Editora Abril. Outubro de 1994. (...) inédito título de Campeão dos Campeões, conquistado ao vencer o primeiro campeonato brasileiro de clubes campeões. 
  3. FAZZOLARI, Felicce Fatarelli. Clube Athlético Paulistano e o primeiro campeonato paulista de futebo. Ludopédio, São Paulo, v. 164, n. 24, 2023. "Na década de 1920, conquistou o Torneio Nacional de Clubes, organizado pela CBD (...)".
  4. a b Quais as competições que antecederam o Brasileirão?. [S.l.]: Revista Placar; Editora Abril. Outubro de 2002 
  5. a b «SPORT: FOOT-BALL - O início dos matches interestaduais - pág 6». O Paiz. 25 de março de 1920. Consultado em 18 de setembro de 2023 
  6. «Conheça as taças do Paulistano, campeão 11 vezes do Paulistão». Club Athletico Paulistano. Consultado em 19 de setembro de 2023 
  7. a b c Madureira, Thiago (18 de maio de 2022). «Paulistano descarta seguir Atlético em busca de reconhecimento de título». Superesportes. Consultado em 27 de agosto de 2023 
  8. a b c «Luta pelo título? Veja como clubes lidam com chance de serem reconhecidos campeões nacionais - Lance!». Lance!. 22 de setembro de 2023. Consultado em 1 de maio de 2024 
  9. a b c d e f g h FERNANDEZ, Renato Lanna. O jogo da distinção: C. A. Paulistano e Fluminense F. C. - um estudo das identidades clubísticas durante a fase amadora do futebol em São Paulo e no Rio de Janeiro (1902-1933). 2016. 507 f. Tese (Doutorado em História) - Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil – CPDOC, Fundação Getúlio Vargas, Rio de Janeiro, 2016. Disponível em: https://repositorio.fgv.br/items/0a36e619-ddaf-4d5e-a61c-a2ad0eb2bb2b
  10. a b c Mário Filho (15 de março de 1946). História do Campeonato Brasileiro - 1 O Globo Sportivo, p.3.
  11. «FOOTBALL». O Estado de S. Paulo. 29 de março de 1920. Consultado em 26 de agosto de 2023 
  12. a b c d e Correio da Manhã (Correio Sportivo). Football Interestadual, 4 de abril de 1920
  13. TNOnline (20 de dezembro de 2010). «Dossiê da unificação: brecha para títulos em 1920 e 1937 | TNOnline». tnonline.uol.com.br. Consultado em 28 de agosto de 2023 
  14. «Revista Oficial do Club Athletico Paulistano Ano XXXII 382 Dezembro 2020 - pág 52/53» (PDF). Club Athletico Paulistano. Consultado em 1 de julho de 2024 
  15. a b «História». Grêmio Esportivo Brasil. Consultado em 19 de setembro de 2023 
  16. a b c Medici, Ademir (27 de março de 2020). «Na praça o povo vê o Paulistano campeão». Jornal Diário do Grande ABC. Consultado em 21 de setembro de 2023 
  17. «Uma taça para os riograndenses - pág 9». O Paiz. 2 de abril de 1920. Consultado em 19 de setembro de 2023