Série 851 a 872 da CP – Wikipédia, a enciclopédia livre
Série 851 a 872 | |
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Locomotiva 855, preservada no Entroncamento. | |
Descrição | |
Propulsão | Vapor |
Fabricante | American Locomotive Company |
Tipo de serviço | Via |
Características | |
Bitola | Bitola ibérica |
Operação | |
Ano da entrada em serviço | 1945 |
A Série 851 a 872, igualmente conhecida como Série 850, corresponde a um tipo de locomotiva a tracção a vapor, utilizada pela Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses entre 1945[1] e 1969.[2]
História
[editar | editar código-fonte]Antecedentes
[editar | editar código-fonte]Durante a Segunda Guerra Mundial, verificou-se uma grande escassez de carvão e outros combustíveis líquidos e sólidos, causando problemas de abastecimento à Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses, cuja frota era composta principalmente por locomotivas a vapor.[3] Para tentar resolver este problema, em 1941 a Companhia experimentou a utilização de óleo combustível nas suas locomotivas, com excelentes resultados, embora esta medida não tenha avançado, devido às dificuldades em importar este combustível.[3] Assim, a Companhia começou a utilizar carvões nacionais e lenhas, mas a sua reduzida capacidade como combustível provocava problemas nas marchas, e graves danos ambientais, uma vez que levou à desmatação massiva junto das estações.[3] Por outro lado, a já avançada idade do parque motor também estava a causar problemas na tracção dos comboios de mercadorias e passageiros, com quase metade das locomotivas de via larga apresentando cinquenta ou mais anos.[3] Desta forma, a empresa iniciou um programa de substituição do material circulante, para abater as locomotivas mais desadequadas às necessidades, fabricar algumas em território nacional, utilizando peças sobressalentes, e importar locomotivas do padrão de guerra, consideradas as mais úteis aos tipos de tráfego praticados em Portugal.[4] Por outro lado, o Ministério da Economia também garantiu o abastecimento de óleo combustível à Companhia, pelo que esta pôde procurar por locomotivas deste tipo.[4]
Aquisição, montagem, e entrada ao serviço
[editar | editar código-fonte]A CP iniciou várias negociações com importadores estrangeiros, que culminaram com a encomenda de 22 locomotivas à firma American Locomotive Company em 1944, iguais às que estavam a ser utilizadas em grande número na Índia Britânica,[4] que empregava uma bitola semelhante à ibérica.[5] Duas locomotivas deste tipo já tinham sido adquiridas pela Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses da Beira Alta.[5] Com efeito, tinham sido desenhadas segundo os padrões de guerra, sendo portanto muito fiáveis e fáceis de conduzir, mas simples e rápidas de construir, devido ao uso de processos que aceleravam o seu fabrico, como a utilização de peças comuns a outras locomotivas, e que necessitavam de mão-de-obra menos intensiva.[4] Com esta aquisição, a companhia procurou melhorar os seus serviços, especialmente os ónibus, correios e mercadorias.[5] Foram as primeiras locomotivas americanas em Portugal, e as únicas a vapor desta nacionalidade.[6]
Estas locomotivas foram fabricadas em 1944 pela ALCO,[6] tendo chegado a Lisboa desmontadas, entre Junho e Agosto de 1945.[4][5] As primeiras catorze unidades foram transportadas nos navios Inhambane, São Tomé, e Gaza.[4][5] As locomotivas restantes foram transportados noutros navios, incluindo o Amarante.[5] Devido à sua urgente necessidade, foram construídas muito rapidamente, nas oficinas de Santa Apolónia e do Barreiro, sob a orientação dos engenheiros Pedro de Brion, Magalhães Viana, e Valentim Bravo.[5] Com efeito, quando o engenheiro americano Mac Shelley, da firma construtora, veio a Lisboa supervisionar a montagem das locomotivas, viu que uma já tinha sido concluída e estava pronta a funcionar.[4] Esta unidade, que recebeu o número 852, realizou a sua experiência oficial em 30 de Junho de 1945, entre Lisboa e Vila Franca de Xira.[1]
O primeiro comboio rebocado por uma destas locomotivas foi uma composição de mercadorias, com 1200 t, entre as estações de Santa Apolónia e do Entroncamento, em 2 de Julho de 1945, tendo chegado aos 95 Km/h.[1][5] No início da viagem, estiveram a bordo da locomotiva vários representantes da CP, o Ministro das Obras Públicas, Augusto Cancela de Abreu, o Ministro da Marinha, Américo Tomás, o sub-secretário de estado das comunicações, Roberto de Espregueira Mendes, e director-geral dos caminhos de ferro, Rogério Vasco de Carvalho.[5] Após percorrer uma pequena distância, terminou a visita, e o comboio seguiu para o Entroncamento.[5]
Vida útil, fim dos serviços, e restauro
[editar | editar código-fonte]Provavelmente, estas locomotivas só realizaram serviços nas linhas a Sul do Rio Douro,[1] tendo sido muito utilizadas, devido à sua potência, nas composições mais pesadas, como nos comboios mineiros originários de Aljustrel, chegando por vezes a rebocar sozinhas oitenta vagões.[2] Apesar da sua fiabilidade, sofreram vários acidentes graves, como três explosões, uma em Albergaria e outra junto a Portela de Mouratos, em São Marcos da Serra, que vitimou a locomotiva n.º 869, em Outubro de 1965.[2]
Com o fim da tracção a vapor na zona Centro, em 1968, foram passadas para o Sul de Portugal, mas logo no ano seguinte também foi extinto o vapor nesta região, pelo que as locomotivas desta série foram parqueadas, para serem desmanteladas.[2] Apenas a 855 sobreviveu, tendo sido preservada no Museu Nacional Ferroviário, no Entroncamento, devido à sua importância como espécime único, do ponto de vista técnico, e aos serviços prestados.[2]
Em 1990, esta locomotiva encontrava-se muito degradada após mais de vinte anos de imobilização, pelo que foi alvo de um programa de tratamento e reparação, para retomar a sua aparência original.[2] Os trabalhos, que começaram em Agosto, consistiram numa peritagem, e na limpeza e beneficiação de vários componentes, como a caixa de fogo, os rodados, a caixa de fumo, o tender, o pavilhão, as conjugações, todos os equipamentos de controlo e comando, o fixe, e o corpo cilíndrico.[2] Também foi necessário repor uma porção da chapa da parte interior da caixa de fumo.[2] Após este processo, a locomotiva ficou apta para funcionar.[2]
Descrição
[editar | editar código-fonte]Esta série era constituída por 22 locomotivas, que funcionavam a óleo combustível,[4] e que podiam atingir uma velocidade máxima de 95 km/h.[5] Apresentavam um traço distinto do habitual entre a tracção a vapor em Portugal, mais elegante, tipicamente americano.[6] Usavam o sistema de expansão simples.[6] Fizeram todo o tipo de serviços, especialmente mercadorias, mas devido à sua simplicidade de funcionamento, também era frequente o seu uso em comboios de passageiros.[7]
Ao contrário da maioria das suas congéneres em Portugal, estas locomotivas tinham uma caixa de fogo interior em aço, que eram menos dispendiosas do que as de cobre.[1] No entanto, também se revelaram mais sensíveis à utilização de águas não tratadas, aumentando a corrosão das chapas e diminuindo a sua resistência mecânica, reduzindo o rendimento da locomotiva, e a vida útil das caldeiras.[1] Para tentar evitar estes problemas, em 12 de Dezembro de 1949 foi aplicado na locomotiva 860 o Tratamento Interno Integral Armand, criado pelo engenheiro francês Louis Armand, e que consistia num doseador no tender da locomotiva, que misturava na água um reagente denominado complexo.[1] Este sistema obteve um grande sucesso, tendo permitido uma redução considerável dos trabalhos de caldeiraria nas oficinas.[1]
Ficha técnica
[editar | editar código-fonte]Características gerais
[editar | editar código-fonte]- Número de unidades construídas: 22[4]
- Ano de entrada ao serviço: 1945[1]
- Fim do serviço: 1969[2]
- Tipo de tracção: Vapor[1]
- Velocidade máxima: 95 km/h[5]
- Fabricantes: ALCO, oficinas da CP em Santa Apolónia e no Barreiro[1]
Lista de material
[editar | editar código-fonte]- 855: Preservada no Museu Nacional Ferroviário, no Entroncamento.[2]
- 869: Destruída numa explosão, em Outubro de 1965.[2]
Ver também
[editar | editar código-fonte]Referências
- ↑ a b c d e f g h i j k MARTINS et al, 1996:59
- ↑ a b c d e f g h i j k l MARTINS et al, 1996:61
- ↑ a b c d MARTINS et al, 1996:57
- ↑ a b c d e f g h i MARTINS et al, 1996:58
- ↑ a b c d e f g h i j k l «locomotivas a óleos pesados» (PDF). Gazeta dos Caminhos de Ferro. Ano 57 (1382). Lisboa. 16 de Julho de 1945. p. 375. Consultado em 21 de Junho de 2012 – via Hemeroteca Municipal de Lisboa
- ↑ a b c d MARTINS et al, 1996:90
- ↑ MARTINS et al, 1996:90-91
Bibliografia
[editar | editar código-fonte]- MARTINS, João;, BRION, Madalena; SOUSA, Miguel; et al. (1996). O Caminho de Ferro Revisitado: O Caminho de Ferro em Portugal de 1856 a 1996. [S.l.]: Caminhos de Ferro Portugueses. 446 páginas
Ligações externas
[editar | editar código-fonte]- «Página com fotografias da locomotiva n.º 855 no Entroncamento, no sítio electrónico Ralfaneurope» (em inglês)